sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Sonhei contigo noite passada. E foi a única vez desde que partiu. Setecentos e noventa e quatro dias depois da tua partida... tanto tempo, muito tempo para quem não passava nem algumas horas longe. De fato me injuriava, por saudades e talvez até ciúmes, que apenas eu, justo eu, não pudesse te ver nem em meus sonhos. E setecentos e noventa e quatro dias depois, já corrido tanto tempo, quando achava que não poderia mais, sonhei contigo. Em meu sonho, eu estava em um lugar qualquer, com pessoas que nem sei quem são, pegava então minhas coisas apressada porque tinha algo a fazer, ao sair, alguém se aproximou do enorme portão marrom, desses que parecem de garagem, e acionou a sua abertura. Enquanto se elevava o maciço portão, eis que tua imagem aparecia.
Estava com o mesmo jeans, a mesma camisa preta com listras azuis que te comprei, o mesmo terno em veludo chumbo, os mesmos óculos e, o mais importante, o mesmo olhar. O mesmo olhar terno, aconchegante, com a serenidade e a ironia que só tu conseguias harmonizar. Sorria de certo modo e me deixava ir. Eu tão apressada, não parava, não lhe indagava, não perguntava dos porquês que ficaram me torturando por todo esse tempo (ahh e como esses porquês me torturaram). Não corria para abraçar-te, coisa, aliás, que sempre tive a sensação que seria a primeira a fazer quando te visse, é que meus braços ficaram tão vazios depois da tua partida. Mas ali, diante de ti, embora pudesse me aproximar e sentir teu abraço, teu cheiro, te sentir ao menos uma vez mais, apenas segui apressada para algo que não sabia ao certo o que era, mas que precisava fazer ou encontrar, provavelmente com uma paz e uma liberdade absolutamente inesperada.
Não sei ao certo se foi sonho ou uma visão mítica. O certo é que, talvez, mesmo em meu sonho, precisasse correr ao encontro da vida e só tu poderia abrir a porta que ainda me prendia.
Tu que me trouxe tanta vida quando me amou e se permitiu ser amado, mas que também me condenou a uma dor tão intensa e profunda ao partir. Tu que me deu alma, verso, melodia ar... e tu que por amor e pela saudade aprisionou meu espírito, ontem, naquele sonho, me libertou novamente.
Tu bem sabe que voltei aos poucos a me encantar pela vida, faz alguns meses, poucos na verdade, mas voltei a ver cor nas coisas a minha volta, e poesia, e rima, mesmo no nada.

Meus versos hoje não são mais para ti e, nós dois sabemos, por mais que eu negasse, que cedo ou tarde isso aconteceria. Consegui me libertar da culpa que senti por viver sem ti e por “trair” nosso infinito e inabalável amor, embora lute algumas vezes com as lembranças de nós, e de ti, dos teus olhos que sempre me afagavam a alma. Mas é verdade que não te busco mais nas coisas que faço ou me declaro nos versos que escrevo. Não posso negar também que ainda te amo e sempre amarei, todavia aprendi a amar-te à parte e, só te amando a parte, é que aprendi e consegui finalmente amar novamente as pessoas e a vida.

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