terça-feira, 15 de setembro de 2009

XII - confesso-te em epopéia...

Na noite gélida eu nasci
Desde já eram rorídulas as poucas lágrimas que tinha
E como era cria do inverno junino
Equiparei meu sangue às frias gotas de orvalho
Assim
meio réptil meio humana
Rastejei pelos dias
E me escondi na escuridão das noites
Tanto tempo ocultei minha alma
Que cheguei a acreditar não ter uma
Conheci rostos, nada mais
Escutei risos e choros
não soube ao certo o que significavam
Não senti dor profunda
talvez por isso o tempo tenha mutilado com voracidade meus pensamentos
que eram sábios
mas não tinham compaixão
que eram fiéis
mas ausentes de eficácia

Conheci como ninguém a alma humana
mas nunca a vivi
Me perdi na racionalidade
Apenas sobrevivi
E desejei que cada dia se contorcesse veloz
no ímpeto
agradeci por ser menos um
e amaldiçoei o amanhecer apesar de me encantar com seu espetáculo de cores
Soube de tantas coisas
E nenhuma conheci que me trouxesse alegria
só êxtase momentâneo
Saboreei cada pedaço de vida
Mas tudo que quis foi gastá-la
e gastando-a encontrar o fim vital
nada me parecia tão doce quanto o encontro com Maat

Tudo em mim gritava desesperadamente
no silêncio que aumentava em meu peito
Só a fisiologia animava meu corpo
Meu espírito de fato não habitava em mim
Estava tão longínquo
fraco
opaco
pedante
sombrio
Vivi sem viver
Morria sem morrer
Morria por viver
Vaguei por muitas milhas
Sem saber ao certo porque ainda caminhava rumo ao incerto
Não trazia bagagem
Tudo que tive deixei no mesmo lugar onde adquiri
Não acumulei fardos
Viver era meu próprio fardo

Meu vazio aumentava
Na proporção em que se dava conta de si mesmo
Nada importava
Se não cultivar minha própria desgraça
Por covardia talvez?!
Certo é que me faltaram motivos
Ignorei respostas e indagações e
Na ignorância da minha própria busca
Não vi placas nem sinais de esperança
por fim
Encontrei a finitude de mim mesma
e mesmo sem saber o que buscava
a reconheci no momento que vi
Contudo
ao contrário do que se possa supor
e do que eu mesma acreditava
minha finitude se encerra no meu próprio começo e recomeço
finaliza meu tédio crescente

é sim minha plenitude
que se refaz
se humaniza
chora
ri
ama
traz minha alma de volta ao corpo
e sente:
todas as cores
todos os aromas
toda a vida que envolve meu ser
toda intensidade do calor que um ser pode sentir
mas que vem de dentro
do íntimo que se abre e se harmoniza com o mundo
Minha finitude se encerra na completude
do meu encontro contigo
Encontrei minha plenitude em ti
E como retornando ao verbo criador
senti finalmente a alegria de ser uno e não apenas um

Como já disse em verso:
Ainda me lembro do dia em que
o pouco de luz que havia em mim se encantou pelo que havia de negro em teus olhos
e o que havia da mais profunda escuridão em mim se apaixonou pela tua luz
 
Hoje
resolvi contar
Não por vaidade
e nem por desabafo
mas pela simples ânsia de manifestar o que sinto:
- Há um amor em mim que se multiplica
e que se sufoca por tão grande que é
Precisa explodir
Exaurir-se de amar
e a verdade
é que quanto mais ama ...
... mais aumenta
mais constrange a razão e se entrega...
... a mais cândida e perfeita forma de sentir

O amor trepida minha alma
e canta com tanto fervor que evaporam-se todos os pesares
todas as dúvidas
todos os preconceitos
Há tanto amor em mim
e não existem latitudes ou longitudes
pois há um "quê" transcendental que ignora o tempo e a matéria
que clama apenas por poder dar amor
e que se alegra quando reflete em si mesmo
Que respira,
bebe,
degusta apenas amor
Que transpira amor
Que vive para o amor
Algo de esplendoroso se faz em meu peito
e se regozija quando tua face mira
minha cálida e até então hepática alma